domingo, 12 de abril de 2009




A guerra contra o tempo

Respect 2009

O evento reúne pintores, malabaristas, designers, músicos, místicos, hippies, visionários, além de amantes da natureza e da cultura. Os ingressos custam R$ 35,00 (até 22/03) e R$ 50,00 (até 09/04 ou enquanto durar o lote).



Assim era descrita a festa rave que fui neste feriado com um amigo. Meu objetivo era o de me divertir ao mesmo tempo em que procurava entender o que esse enunciado queria dizer. Bem, ao fim de tudo não sei se compreendi tão bem, mas acho que boa parte das minhas dúvidas em relação às raves foi saciada. Nesta festa, diversos grupos de jovens super, hiper, mega “modernos” se encontram para exibir, sejam seus corpos, sejam seus trabalhos com fotografias e pinturas que nada mais são do que registros de outras raves e pinturas de deuses hindus, ou outras coisas ligadas ao mercado místico e neo-esotérico. Mas cabe aqui, entendermos o que significa esse termo “modernos”. Durante toda a festa o que mais me surpreendeu foi a forma como símbolos e valores criados em gerações anteriores, como a onda hippie e suas pinturas e músicas, ou ainda a estética headbanger e a prática de yoga, etc. eram recapeados por uma estética eletrônica. A cada nova surpresa eu era arremessado no umbigo de uma geração que vêm colada à minha e que, definitivamente me assustava (o susto não era com eles, mas comigo mesmo). Aos poucos é possível compreender essas “releituras” “modernas” feitas por eles. Se trata das mesmas “releituras” criadas pelo mercado de moda, onde a “regra” é criar um “gosto” e explicá-lo magicamente, ontológicamente. Algo do tipo: “serão essas as cores do próximo verão, porque é assim que a coisa funciona”. Os profissionais responsáveis por dar essas respostas no campo da moda, são ligados aos chamados burreaux de estilo e o processo de trabalho deles é escondido a 7 chaves uma vez que não há processo social capaz de explicá-lo. Já em relação às raves o que parece é que a graça é ser diferente, excepcional à sua maneira. Romper barreiras, eis o segredo. Simbólicamente tudo é importante. É importante que os produtos sejam vendidos 4 ou 5 vezes acima do preço normal, pois isso, além de afastar os não desejáveis, aponta para o fato de que o mercado não é um problema para os escolhidos que ali estão, é importante andar sem camisa, mostrando os músculos, porque afinal, é assim que todos vêem que os corpos sarados estão na moda, feliz daqueles que podem ostentá-los. É um grande jogo onde quem pode mais se exibe mais. No fundo, o que une todas essas pessoas é uma luta contra o tempo e seus limites. Ao pegarem estéticas e valores antigos retirando deles justamente aquilo que tinham de político e em termos de resistência, a mensagem que fica é a de que: “Tudo é nosso, o tempo é nosso à medida que o mercado nos oferece a possibilidade de comprar e transformar” A palavra de ordem da sociedade do consumo, como colocou Maria Rita Kehl em algum artigo que li, é: “você pode tudo, não há limites para você, cliente especial” Segundo o que ela dizia os Clientes Especiais são aqueles que obedecem direitinho aos apelos publicitários que dizem coisas como “No Limits for you”, pois são aqueles que olham para o mundo não a partir do espectro dos direitos humanos, mas sim a partir dos direitos do consumidor, o que os faz entender seus direitos e não os deveres a partir da lógica da vida privada. São aqueles que pagam propinas, que contratam seguranças privados, que lêem a revista Veja para confirmarem a fantasia de que o mundo das classes médias e altas é “o” mundo e consequentemente são os mesmos que freqüentam cursos “alternativos”, porque ser religioso é “brega” e que condenam os pobres pelo mal de tudo. Ser “moderno” nesse contexto é querer repaginar o tempo, é teatralizar o domínio do mercado sobre a única coisa que até hoje ele não conseguiu domar, o tempo e seus limites. Se é possível cobrir a favela com um muro, não é possível esconder a realidade de que o habitante daquela localidade irá envelhecer e morrer, tal qual os clientes especiais. É por isso também que a festa não para, há aquela ótica de que os mais “especiais” ficam até o final. Bem, ditas todas essas coisas, fiquei feliz por não agüentar e sucumbir logo no começo, entendendo que estou ficando mais “velho” e ficando feliz por isso. Não pretendo ser nenhum super herói moderno e para além das luzes, das batidas ensurdecedoras, eu pude enxergar a violência daquele espetáculo. Natureza e cultura, como diz o enunciado da festa, é tudo o que não é pensado por esses jovens, ponto final.

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